Avaliação das reações afetivas e conativas

AVALIAÇÃO DAS REAÇÕES AFETIVAS E CONATIVAS1

Nesse passo do exame psíquico ou do estudo do paciente pelo aspecto psicológico devemos analisar o comportamento explícito e as reações afetivo-emocionais. 

A primeira condição diz respeito às funções conativas no plano de exteriorização dos atos, que apresentam particularidades decorrentes do rearranjo dessas funções em relação íntima com as funções afetivas e intelectuais. Todo ato requer, necessariamente, o concurso de várias funções, sobre as quais tem repercussão. 

A conação ou atividade, na acepção de Comte, compreende três funções subjetivas: a atividade propriamente dita, no sentido de estímulo ou coragem, a inibição ou prudência e a perseverança, que mantém o trabalho mental ou o ato explícito. 

Em condições normais essas funções trabalham harmonicamente, sendo indispensáveis à harmonia do trabalho mental e da ação explícita.

A existência de funções subjetivas subjacentes à ação explícita e a participação dessas no trabalho mental foi estabelecida por Comte ao determinar o conjunto das funções, que comporiam a Teoria Sociológica da Personalidade Humana. Isso permite compreender as características individuais exteriorizadas no comportamento explícito e no trabalho mental em condições normais, e avaliar o conjunto de condições mórbidas, quer intrínsecas, quer extrínsecas à atividade propriamente. Analisamos anteriormente as alterações intelectuais extrínsecas decorrentes de alterações ao nível das funções conativas. 

Do ponto de vista prático, o exame das funções conativas pode ser avaliado através da capacidade de empreendimento: aqui devemos considerar o empreendimento no meio social e no ambiente local, através dos informes de anamnese objetiva e subjetiva, dos informes do Serviço Social e, no caso de pacientes hospitalizados, também das informações da Enfermagem. 

Importa ver se o paciente coopera e auxilia em seu tratamento e no dos demais pacientes ou se, pelo contrário, mostra-se arredio e desinteressado pela sua situação e pelos demais; se se vale por si próprio quando tem condições, na procura das coisas que necessita, ou se nada faz; se se agita ou deambula sem motivo ou finalidade aparente, se apresenta sono agitado, sonambulismo, terror noturno ou sonilóquios. A atividade explícita pode ser avaliada através da ocupação terapêutica, se for o caso.

Com relação ao empreendimento no meio social, podemos avaliar uma série de condições como a instabilidade, a desorganização, a rigidez excessiva ou o desmazelo nos afazeres, dados estes que analisados em conjunto com as demais características de personalidade nos orientam de modo preciso no estudo do caso.

No plano afetivo o estudo do caso pode ser analisado pelo exame direto do paciente durante a feitura do exame psíquico ou da tomada dos dados de anamnese. Assim, estudamos o seu estado do humor que pode apresentar-se normal ou, pelo contrário, variar entre o polo depressivo e eufórico, ou pode mudar bruscamente e sem motivo aparente de um polo a outro. Lembrar que algumas doenças clínicas são acompanhadas de alterações do humor. 

Outro aspecto, ainda dentro do exame psíquico, seria o da avaliação da atitude subjetiva. Apresenta timidez, insegurança, dependência, resignação, alheamento, viscosidade?

Essas características devem ser apreendidas pelo examinador e descritas de modo claro.

O exame tem sequência no estudo da afetividade exteriorizado nas reações afetivo-emocionais em diferentes níveis e nas diferentes condições. Esses dados devem ser obtidos dos informes de Enfermagem e do Serviço Social:

  1. Atitude afetivo-emocional nas relações interpessoais com relação ao pessoal de serviço, com os demais pacientes, com os familiares durante as visitas. Esses dados serão registrados no relatório da Enfermagem e do Serviço Social e devem ser suficientemente completos e claros para que se possa avaliá-los corretamente.
  2. Atitude afetivo-emocional nas relações interpessoais no meio social analisada dos informes objetivos e dos dados sociais, principalmente aqueles relacionados ao ambiente doméstico. Devemos levar em consideração não apenas as reações do paciente no meio social e familiar, mas também a repercussão de sua doença no ambiente social e doméstico. 
  3. Atitude afetivo-emocional ante a própria doença. Aqui verificamos se as queixas subjetivas do paciente estão em concordância ou não com as condições somáticas. Essas podem variar no sentido de exagero decorrente de uma hiperemotividade ou de insegurança, ou apresentar, pelo contrário, indiferença, que pode ser consequente ao desconhecimento da gravidade das condições somáticas. Esses aspectos devem ser avaliados corretamente junto ao paciente: se aceita ou não sua situação; se apresenta queixas constantes; se se mostra interessado por sua recuperação ou é indiferente à mesma.

Na obtenção desses dados é indispensável que a Enfermagem, a Assistente Social e o Médico trabalhem em conjunto e que todos tenham a compreensão da importância e da utilidade dos elementos estudados para a avaliação correta do doente. Esses transcendem ao próprio doente, pois muitas vezes implica orientar a integração deste no ambiente social e doméstico. 

Devemos ressaltar a importância das informações da Enfermagem no sentido de que muitos pormenores do exame conativo e das reações afetivas escapam aos médicos, pelo menor tempo que dedicam a cada um. Isso fará com que o registro sobre o comportamento e sobre as reações afetivas do paciente não seja tomado de modo automático e impreciso. 

Por outro lado, muitas particularidades relacionadas à atitude e às reações afetivo-emocionais escapam ao exame psíquico, que fazemos, porque esse constitui uma condição particularizada e até certo ponto formal no relacionamento interpessoal. 

A descrição do comportamento no meio hospitalar e o relacionamento para com os demais pacientes e o pessoal de serviço revela assim elementos que fogem ao exame médico.

De posse desses dados devemos analisar o porquê das alterações a esses níveis e corrigir o paciente ou o ambiente. Esse trabalho externo ao ambiente hospitalar deve ser feito pelo assistente social, pela educadora sanitária, pela enfermagem e pelo médico.

  1. Texto organizado por Roberto Fasano, em 2003, a partir de aula proferida por Aníbal Silveira, no Curso de Psicopatologia da Faculdade de Medicina de Jundiaí, no ano de 1977, em Jundiaí, sem referência de quem a compilou. Revisto em 15/02/22 por integrantes da Comissão de Revisão do CEPAS: Flavio Vivacqua, Francisco Drumond de Moura, Paulo Palladini e Roberto Fasano. ↩︎