Parafrenia segundo Kleist. Parafrenia em sentido estrito

PARAFRENIA SEGUNDO KLEIST1

O nome parafrenia vem de phrenos, mente e para, ao lado: portanto, é um desvio do trabalho mental que caracteriza essencialmente a parafrenia. Não estou certo se foi Kraepelin quem introduziu esse termo. Na escola francesa, o que se chama parafrenia hoje, tinha o nome de delírio crônico, delírio sistematizado ou delírio alucinatório. Na escola alemã, tinha o nome de Wahn, delírio também ou então Verrücktheit: deslocamento ou desvio da personalidade.

No século passado, Pinel definiu um grupo que era distinto da melancolia, distinto da mania. Mais tarde, Esquirol descreveu os casos de monomania, que distinguia das manias, onde havia um estímulo afetivo como fundamental, de outras onde o aspecto era mais de ordem intelectual. Assim, a monomania intelectual de Esquirol foi logo aceita como sendo uma variedade delirante. Isso correspondia ao termo que os alemães usavam como Verrücktheit.

Ainda na escola francesa, em 1868, Morel descreveu os casos de loucura delirante, chamando atenção para o aspecto particular do fato de haver concepções anormais baseadas em delírio. Em 1872, Falret descreveu mais precisamente esse quadro. O trabalho de Falret não conhecemos, não tivemos acesso a esse livro, nem existe mais também, de modo que é difícil encontrar-se. Mas Falret, citado pelos autores daquela ocasião, estabelece uma concepção muito próxima da que denominamos parafrenia nos dias de hoje. Falret mostrou que havia um delírio crônico que tinha uma evolução muito particular: uma fase inicial delirante interpretativa, uma fase alucinatória subsequente e uma fase francamente delirante, geralmente, com delírio de grandeza. Observem que é uma abordagem de interpretar a doença como um contínuo, em que há fases que se sucedem. No Brasil, Juliano Moreira, estudando essa questão, mostrou que há uma fase chamada de ruminação, em que o indivíduo fica interpretando as coisas que se passam em torno dele, uma fase seguinte de excitação, de não estar bem ainda seguro de que aquelas coisas são reais (portanto, duvidando em certo ponto), que converge para um quadro alucinatório e, finalmente, para um quadro delirante permanente.

Mais tarde, em 1891, Magnan retomou o problema dos delírios e achou que havia – nesse grupo descrito pelos autores anteriores, inclusive o grupo de Falret -, dois aspectos fundamentais: um que se caracterizava pelo delírio alucinatório e outro em que há um delírio puro, isto é, um delírio que obedece a uma sistematização. A partir de Magnan, portanto, temos o chamado delírio crônico alucinatório e o delírio crônico sistemático, no qual não há nenhum elemento senso-perceptivo como aspecto fundamental do quadro. 

Mais tarde, em 1910, Sérieux e Capgras fizeram um estudo muito completo dos quadros delirantes crônicos e estabeleceram um conceito, não especialmente em relação à parafrenia, mas em relação à chamada paranóia, delimitando um aspecto que acho fundamental: no delírio sistematizado de Magnan, não existe o fator senso-perceptivo. Isto foi uma caracterização fundamental para o conceito de delírio crônico ou paranóia, como chamavam Serieux e Capgras. 

Na Alemanha, cumpre relembrar que Kahlbaum estudou pacientes com quadros delirantes, que ele denominou de Verrücktheit, ressaltando o aspecto da atividade delirante primária.  

Em 1868, Griesinger retomou os trabalhos da escola francesa, citou inclusive Falret, que era contemporâneo, e Morel também, e estabeleceu uma forma inovadora de análise – já pela patogênese -, dos quadros delirantes crônicos que tanto Kahlbaum como Morel compreendiam como de origem puramente intelectual: considerou que o fundamental não era o fenômeno intelectual e sim um fenômeno afetivo. 

Assim, temos, com Griesinger, o início do estudo patogenético, uma abordagem que se tornaria mais frequente na escola alemã, de procurar ver nos quadros clínicos os fatores patogênicos, isto é, qual seria a causa do surgimento do distúrbio.

Dessa forma, Griesinger estabeleceu vários tipos de alteração: os delírios secundários, a Verrücktheit secundária, os delírios que aparecem por si próprios ou autônomos, de causa endógena e esse delírio que tem por base o aspecto afetivo fundamentalmente. Nessa mesma direção foi conduzido o trabalho de Westphal. Mais tarde, Gaupp delimitou várias formas de paranoia: a paranoia intelectual, a paranoia com delírio de ciúmes e finalmente, a paranoia abortiva.

Kraepelin retomou, mais tarde, esse problema quando fez a divisão dos quadros clínicos em formas endógenas e formas secundárias ou formas exógenas. Em 1895, não tinha ainda definido os quadros de parafrenia. Considerava as demências em geral retomando os estudos de Kahlbaum e de Hecker (as demências catatônicas e hebefrênica, respectivamente), assim como as demências paranoides. Com a evolução dos seus estudos delimitou, no âmbito da demência precoce, dois tipos: um com uma precoce e rápida evolução para o estado demencial e outro que chamou de esquizofrenia, na acepção de Bleuler, porque o distúrbio traduzia um comprometimento no sentido do contato do paciente com o mundo exterior, mas não uma decadência intrínseca da capacidade mental, além de isolar um outro grupo que é a chamada Parafrenia. 

Em síntese, Kraepelin admitiu, inicialmente, a demência precoce no sentido de Morel, a esquizofrenia como uma forma atenuada, uma forma mais benigna da demência precoce e um grupo a parte que achou que deveria ser isolado, a parafrenia. 

Kraepelin refez várias vezes essa classificação. Inicialmente em 1905, em que publicou a primeira edição da “Psiquiatria Clínica”, onde propôs uma divisão baseada apenas no colorido fundamental do quadro clínico. Posteriormente, estabeleceu a diferenciação da parafrenia e da paranóia. Finalmente, em 1921, incorporou a parafrenia no grupo VII da sua classificação, sendo constituído por várias expressões: a forma expansiva; a forma sistemática, que é mais difícil de se apreciar porque o indivíduo não exterioriza diretamente (o contrário do que se passa na forma expansiva); a forma fabulatória, que é a mais produtiva e a parafrenia fantástica, que corresponde à Fantasiofrenia de Kleist. Essas formas caracterizadas por Kraepelin delimitaram a configuração da parafrenia, como um tipo particular de doença mental, do grupo da demência precoce. A demência paranoide seria um grupo e a parafrenia outro grupo. Para estabelecer essa distinção, Kraepelin se baseou no critério evolutivo. Porque são quadros clínicos que aparecem mais tardiamente na vida do indivíduo, que se prolongam muito mais, sem chegar logo ao estado demencial. Além disso, cumpre reiterar, há o colorido clínico geral exteriorizado nos delírios dos doentes, sejam os delírios fantásticos ou a forma expansiva, ruidosa, nas quais o indivíduo se acha dotado de poderes especiais.

Mais tarde, Bleuler concebeu o conceito de esquizofrenia, em uma acepção diferente da de Kraepelin, porque o que interessa estudar no quadro clínico, na sua abordagem, é a dissociação da mente. Kraepelin utilizou essa terminologia para caracterizar uma forma atenuada, um quadro menos grave do que o da demência precoce, isto é, Kraepelin valorizou mais o processo evolutivo do que o processo dinâmico.

Na realidade, em última análise, Bleuler não reformulou o trabalho de Kraepelin, conservando no grupo da esquizofrenia as formas simples, catatônica, hebefrênica, paranoide e incluiu a parafrenia.

Houve, portanto, uma diluição, um retrocesso, uma menor precisão no conceito que estava sendo delineado com muita clareza por Kraepelin. Bleuler ampliou o conceito de demência precoce, mas outros autores investiram em fazer uma revisão, especialmente Kehrer, em Munster na Westphalia e Kolle. Kurt Kolle estudou não só o grupo da parafrenia, mas também a paranoia, no sentido de Kraepelin.

Mais tarde, Kraepelin isolou a Paranoia como uma variedade específica. Na terminologia de Kehrer e de Kolle, a Paranoia passou a ser um aspecto da esquizofrenia, na acepção de Bleuler.

Da mesma forma, Kraepelin mostrou que não somente o grupo parafrênico era esquizofrenia, mas a própria paranoia correspondia a uma forma esquizofrênica também, estudando a parte genética, bem entendido. Assim, vemos que Kraepelin destacou da parafrenia o grupo da paranoia. No entanto, incluiu o grupo da paranoia, não nas formas de origem somática, grupo II, mas no grupo IV em que os problemas eram de ordem constitucional. Assim, como característica fundamental havia, em primeiro lugar, a doença maníaco-depressiva e, em segundo lugar, a paranoia.

De modo que Kolle, fazendo revisão dos antigos quadros clínicos de Kraepelin e de Kehrer, ambos utilizando o critério fenomenológico, portanto, mais no sentido da descrição clínica, não como genética, chegaram à conclusão de que não havia razão para isolar esquizofrenia, parafrenia e paranoia: tudo seria uma coisa só, um grupo único, com manifestações variáveis de paciente para paciente.

Em síntese, quando analisamos a classificação inicial de Kraepelin (1913) temos o grupo da demência precoce com a forma hebefrênica, catatônica, paranoide, a forma simples, e a Esquizofasia, que não tinha isolado inicialmente. Posteriormente, englobou a Esquizofazia nas esquizofrenias também. A parafrenia constituia um grupo à parte, dentro da demência precoce, uma categoria particular com um decurso também particular. Bleuler retomou praticamente os mesmos quadros, apenas incluiu a parafrenia no grupo da esquizofrenia sem chegar a identificá-la corretamente. Ficou então a esquizofrenia de forma hebefrênica, a esquizofrenia catatônica, esquizofrenia paranoide, esquizofrenia de forma simples e englobando então, todos os aspectos que Kraepelin havia dissociado antes, a esquizofasia e a parafrenia. 

Kleist, pelo contrário, dissociou cada um desses grupos em várias formas distintas porque apresentam uma evolução característica, possuem uma condição genética diferente e a patogênese do quadro clínico também é variável de um quadro para outro. Não foi apenas uma dissociação para criar termos novos, foi um estudo mais aprofundado, baseado na observação de pacientes durante muitos anos e depois revistos em catamnese (o importante nisto foi ver o que foi constante no quadro desde o início, aquilo que se modificou e a gênese da modificação também).

Quanto à parafrenia, Kleist a compreendeu em um sentido diverso de Kraepelin.  Para Kleist a parafrenia corresponde a tipos bem definidos e temos, primeiramente, uma forma em que a interpretação se apresenta como fator característico, uma outra, a Psicose Progressiva de Referência apresenta uma maneira distinta de reagir, com falseamento da realidade, ante os estímulos (já não perceptivos) e, finalmente, o Delírio Circunscrito que apresenta uma coerência maior com o quadro clínico e o distúrbio é muito menos evidente no comportamento do paciente, isto é, não revela distúrbio nenhum na primeira apresentação do paciente, só com o tempo, com a convivência ou com o estudo do paciente em várias condições diversas é que podemos surpreender o delírio.

Como será discutido mais adiante, Leonhard propôs uma modificação que consideramos um retrocesso. Ele incorporou no grupo da parafrenia algumas formas paranoides de Kleist: a Psicose Progressiva de Inspiração e a Psicose Progressiva de Influência. Leonhard tomou a parafrenia como sinônimo de esquizofrenia paranoide e incluiu, as três formas de parafrenia de Kleist, num grupo à parte que chamou de Parafrenia Afetiva. 

Neste caso perde-se o fator patogenético, fica um quadro único com uma série de manifestações discordantes entre si e que corresponde realmente a formas clínicas distintas pela patogênese, e pelo aspecto genético também.

Como procuramos sempre salientar, o processo de diferenciação dos quadros clínicos conduzido por Kleist foi sempre baseado no estudo da patogênese.

O critério descritivo utilizado por Leonhard, na análise dos quadros clínicos, o levou a incorporar, no grupo da parafrenia algumas formas caracterizadas como paranoides por Kleist. Assim foi o caso dos quadros confabulatório e o fantástico. Ambos, pela evolução, pela carga genética e pelo colorido clínico, podem ser considerados como duas formas distintas que tem em comum entre si, apenas o aspecto de serem delirantes. Mas eles são típicos ou sistemáticos, pois desde o início do quadro clínico mantém o mesmo colorido.

Duas outras formas que exigem uma distinção com as formas parafrênicas são a Psicose Progressiva de Inspiração, na qual o dinamismo patogênico parte do indivíduo para o meio exterior e na Psicose Progressiva de Influência, o dinamismo patogênico parte dos outros, ou do meio ambiente, para o indivíduo. Aqui cumpre apontar que a psicose de inspiração e a de influência são duas formas que se confundem com as benignas correspondentes, isto é, que apresentam uma evolução benigna, não progressiva, que também apresentam esse aspecto da influência e da inspiração. 

Por sua vez, a forma parafrênica de referência tem uma evolução clínica distinta e com o tempo vai se tornando cada vez mais arrastada e mais amplificado o atrito com o ambiente, ao passo que na psicose de influência ou na de inspiração não há esse problema de alargar-se o atrito, de pleitear, reclamar, protestar, muito característico na psicose progressiva de referência.

Na Psicose Progressiva de Interpretação o elemento fundamental do quadro clínico é o aspecto interpretativo dos dados, não é tanto a ocorrência de alucinações ou da reação afetiva, é mais interpretação dos dados em si, por essa razão, é mais restrito o quadro clínico, do que na forma de referência. Finalmente, no Delírio Circunscrito, temos muito mais coerência na expressão do quadro clínico, no qual o indivíduo tem certa noção de que o que ele está dizendo é delirante, as concepções não são aceitáveis pelos demais, por essa razão há uma tendência para ocultar a atividade delirante, nas outras formas de parafrenias isso não ocorre, ou não é tão evidente.

Esses três tipos, portanto, são formas que Kleist chamou atípicas ou extensivas, extensivas porque envolvem no decurso outras esferas da personalidade que não são aquelas atingidas desde o início da doença, isto é, que conferem o seu colorido clínico inicial. 

Enfim, sob o ponto de vista da patogênese essas três formas da parafrenia de Kleist, divergem das formas paranoide de inspiração e de influência, porque nestas o distúrbio se mantém na mesma esfera da personalidade atingida desde o início do quadro clínico. 

Nas três formas de parafrenia, sempre extensivas, temos a participação da esfera afetiva e da esfera conativa de modo mais acentuado do que nas formas paranoides de inspiração e de influência. No entanto, cumpre ressaltar que as formas de inspiração e de influência, também apresentam a participação de dinamismos afetivos ou conativos. Na psicose de influência há o elemento conativo, o indivíduo sente que os demais agem sobre ele, há uma sensação de que está sendo dominado, que está sendo dirigido. Na psicose de inspiração, há o elemento afetivo, que transparece no dinamismo que parte do individuo para o mundo exterior, há um colorido afetivo que não é tão acentuado nas outras duas manifestações atípicas ou extensivas. O delírio circunscrito apenas se refere a uma condição delirante, às vezes não é uma questão que chame a atenção de início ou que dê motivo para o indivíduo ocultar. Tivemos um paciente que não explicava bem por que estava internado, retinha uma série de informações que achava que não devia comunicar. Esse aspecto dava, como resultado, uma discordância entre aquilo que o paciente pensava (ou raciocinava) com a maneira como agia e essa discordância, não traduzia uma falta de lógica, expressava o fato dele ter, de preferência, uma reação afetiva, sentir que aquilo não devia ser explicado, ser revelado, então procurava ocultar e, dessa forma, cometia contradições que são características desse quadro clínico.

Como quadro geral, a parafrenia, no sentido de Kleist, é como a parafrenia em relação a Kraepelin, aparece mais tardiamente do que as outras formas. Em segundo lugar, a maneira como o indivíduo apresenta o quadro clínico é aceitável à primeira vista, quer dizer, não há uma dissociação essencial e evidente, como nos casos das formas paranoides. Aqui temos uma maior coerência no quadro; em contato com o paciente vamos saber que realmente aquilo que apresenta é fruto da sua imaginação, menos acentuada do que na Fantasiofrenia, por exemplo, que é uma forma de demência precoce e menos do que na Confabulose Progressiva, onde também há uma tendência expansiva. E também, na comparação com a Psicose Progressiva de Inspiração, na qual o indivíduo tem uma certa expansividade e revela idéias que não são de grandeza, de autoafirmação, mas são, em certa medida, ideías de coisas que produz ou como realizador de grandes coisas, às vezes pode estar ligado com fenômenos alucinatórios: isto não é essencial ao quadro clínico, mas muitas vezes a inspiração, tem por base, o aspecto alucinatório também.

Quando começamos a nossa atividade clínica atínhamo-nos à escola francesa. Dessa forma, admitíamos os vários quadros de parafrenia: a alucinatória e a interpretativa ou sistemática. Outras formas que Kleist tinha descrito, a forma fantástica e a forma com idéias de grandeza não correspondiam à parafrenia na nossa acepção. Quando conhecemos os trabalhos de Kleist verificamos que essas duas formas estavam, de alguma maneira, incluídas na sua sistemática.

Para um diagnóstico mais assertivo das formas parafrênicas é necessário observar muito tempo o paciente, ter dados objetivos que permitam aferir as concepções que está apresentando, especialmente em relação à forma de delírio circunscrito. 

De qualquer forma, do ponto de vista da patogênese, há dois aspectos que devemos acentuar na análise da parafrenia. Fundamentalmente, o decurso, que é mais tardio, a carga genética é diferente, é distinta, e o aspecto de ser variável durante o decurso do quadro clínico, embora nenhum deles chegue ao estado demencial, a variabilidade decorre de ser atingida de preferência a esfera afetiva, ou a conativa, ou a intelectual, que são os elementos patogênicos que permitem explicar o quadro clínico e a evolução do quadro clínico: o diagnóstico não é feito pela evolução, mas a análise da evolução está implícita no diagnóstico que fazemos.

No âmbito da comparação com o grupo das formas delirantes paranoides, temos a Somatopsicose progressiva, a Autopsicose Progressiva e a Alucinose Progressiva. Nessas, o elemento fundamental é dado pela participação da afetividade, embora de modo diverso.

A afetividade é que dá um colorido, mais no sentido vegetativo, no quadro clínico da Somatopsicose e mais na noção da própria identidade (subjetiva), da interpretação do que se passa com o próprio indivíduo, no caso da Autopsicose. Em relação ao contacto com o mundo exterior, tendo em vista a ocorrência de alucinação ou automatismo mental, temos a Alucinose Progressiva.

Notem que é a afetividade o setor de origem relacionado, genetica e patogenéticamente falando, ao quadro clínico. Porém, patogeneticamente, de modo diverso: na Somatopsicose, na relação com o setor instintivo da personalidade, na Autopsicose na relação com a noção de si próprio (portanto, o estado subjetivo mais intelectual) e na Alucinose com o contato com o mundo exterior no sentido aferente, não eferente. 

Na Confabulose Progressiva temos a participação da esfera conativa, como elemento fundamental da patogênese, acarretando um contacto mais expansivo, mais produtivo em relação ao meio ambiente. Na Psicose Progressiva de Inspiração e na Psicose Progressiva de Influência, formas de demência precoce paranoide ou esquizofrenia paranoide, temos a perturbação fundamental que se passa na esfera intelectual, mas nessa participação temos também um colorido mais ligado com o aspecto afetivo ou conativo, no caso da inspiração e no caso da influência, respectivamente, ou somente afetivo como no caso da Fantasiofrenia. De qualquer forma, é uma esfera única que é atingida.

Quando se refere às parafrenias, no sentido de Kleist, temos a participação não só das esferas intelectual, conativa e afetiva, mas de todas em conjunto, alteradas de modo primário. 

Nas formas paranoides a alteração envolve, primariamente, uma determinada esfera e, secundariamente, outras esferas da personalidade que caracterizam o quadro clínico: portanto, envolvem mais os sistemas psíquicos mobilizados no contacto com o meio exterior. 

Nas parafrenias há um distúrbio primário não só da esfera inicial, intelectual, mas também da esfera conativa e da esfera afetiva. Em relação à participação da esfera conativa há a Psicose Progressiva de Interpretação e a Psicose Progressiva de Referência. No Delírio Circunscrito, temos a participação da esfera afetiva predominantemente, donde vem a noção que o indivíduo tem de que as concepções que apresenta são um distúrbio, são uma anomalia, portanto, discordantes da realidade e daí passa a tentar ocultar esse distúrbio.

Enfim, a diferença fundamental que há entre Kleist e os outros autores é que ele se baseou na patogênese. A descrição do quadro clínico é o que os autores em geral fazem. Podemos observar o indivíduo por quinze, vinte anos ou mais que isto, até trinta anos, sem que haja um estado demencial caracterizado, mas há um aspecto de incapacidade que se torna perceptível. Nas formas de esquizofrenia paranóide, por outro lado, o indivíduo chega mais cedo ao estado demencial.

Em relação à parafrenia, portanto, o essencial é diferenciar os pacientes que às vezes se confundem, especialmente a forma circunscrita com a paranoia ou a fantasiofrenia, quando o indivíduo elabora uma série de coisas que não tem nenhuma base lógica, mas ele assume como se fosse realidade, configurando, portanto, um dinamismo afetivo na patogênese do quadro clínico.

  1. Texto organizado por Roberto Fasano Neto, em 2003, a partir de aula de Aníbal Silveira, sem referência de data e lugar, sendo revista, em 30/11/22, por integrantes da Comissão de Revisão do CEPAS: Flávio Vivacqua, Francisco Drumond de Marcondes de Moura, Paulo Palladini e Roberto Fasano Neto. As referências adicionais em azul serão vinculadas a um texto relacionado com um determinado autor ou um determinado assunto. ↩︎