ESQUIZOFRENIA: KLEIST, KRAEPELIN E BLEULER1
O grupo das psicoses esquizofrênicas apresenta a melhor condição para se verificar os diversos modos de encarar as doenças mentais. O problema, de ordem genética, explicando a ocorrência de certos tipos de psicoses em relação a certos arranjos da estrutura da personalidade (esferas constitucionais), a prevalência de certos quadros clínicos relacionados com cada esfera de personalidade, acarretando quadros variáveis, mas com certa sintomatologia em comum.
No nosso modo de ver, a base fisiogenética pode explicar tudo desde que consideremos a participação genética sob dois aspectos: o aspecto da esfera da personalidade atingida e o aspecto da intensidade ou atenuação da carga genética envolvida. Em relação à atenuação da carga genética e da expressão do quadro clínico temos que considerar a participação genética no sentido do ciclo heredológico.
Assim, no ciclo heredológico, temos os grandes grupos de psicoses endógenas: a epilepsia (que não é uma psicose endógena, mas sim uma condição endógena), a esquizofrenia, o grupo da PMD, (como padrão das formas reversíveis) e a Oligofrenia (que não é uma psicose, mas uma condição permanente).
Na realidade, temos quatro grupos, mas em cada um deles – que traduz uma reação global da personalidade, diante do estado mórbido, baseado na tendência genética -, temos uma atenuação do quadro clínico. Qualquer que seja a categoria do grupo mórbido – no âmbito da nossa classificação das psicoses, quer seja epilepsia, esquizofrenia ou PMD -, temos um grupo de psicoses típicas, que são as psicoses progressivas e o grupo das psicoses reversíveis (como expressão da atenuação da carga genética). Esses dois grupos constituem os quadros constitucionais. Nesse caso, reiteramos que o aspecto do decurso progressivo ou reversível – que depende da tendência genética -, pode ser evidenciado na própria condição pré-mórbida do paciente através dos dispositivos constitucionais da personalidade.
Há ainda outras condições mórbidas endógenas (todas são endógenas, porque dependem do fator genético), que são uma atenuação maior da carga genética, em relação ao grupo constitucional, que chamamos diatéticas e Kleist as denominava de degenerativas. Denominamos diatética porque é a expressão da diátese no sentido comum, clássico, da tendência latente, que não se manifesta na ocorrência diária. Quando comentou o nosso trabalho, Kleist não fez objeção à nossa denominação de psicose diatética.
A atenuação maior do quadro clínico, no sentido heredológico, vai expressar uma configuração da personalidade, nos níveis conativo e afetivo, que se manifestam como expressão anormal (portanto, congênita e endógena), mas que não constituem uma psicose, e sim uma atenuação em relação ao quadro clínico, uma condição permanente, em que o comportamento se manifesta como anormal, por tendência genética.
Como uma atenuação maior ainda ocorrem os traços de personalidade, traços anormais que a maioria dos autores inclui como personalidades psicopáticas. Distinguimos o conceito de personalidade psicopática dos traços de personalidade isolados porque naquela há uma alteração do conjunto da personalidade.
Temos em seguida as neuroses, como outro grau de atenuação da tendência genética, dando em consequência quadros cada vez mais atenuados e, ao mesmo tempo, mais frequentes na população média.
Finalmente, nas psicoses ocasionais teríamos elementos para verificar a tendência genética através do colorido do quadro clínico, isto é, não é uma condição ligada necessariamente à tendência genética, mas o colorido do quadro; esse é de ordem genética.
Temos aqui o ciclo heredológico em uma perspectiva mais ampliada, que não engloba apenas os quadros psicopatológicos, mas outras condições: os traços de personalidades, as neuroses e os quadros ocasionais, com tendência genética concordante com o quadro clínico fundamental. Assim, em todos esses quadros há a possibilidade de reconhecer a tendência genética para a Epilepsia, para a Esquizofrenia e para a PMD. Em relação à Oligofrenia, o que se manifesta são os elementos degenerativos do cérebro, aquelas condições em que há alteração de mielina, alterações outras por processos desmielinizantes ou outros processos cerebrais, que correspondem à tendência genética para a Oligofrenia: essa é uma hipótese a ser verificada ainda, mas há uma forte correspondência com a realidade clínica.
Cumpre assinalar que não se pode confundir psicose reversível com a psicose diatética. Na psicose reversível o indivíduo retorna à completa normalidade após o surto (como ocorre no grupo da PMD, que se trata de um grupo de psicoses constitucionais). Na psicose diatética também ocorre um retorno completo à normalidade após o surto, isto é, nesse sentido também é reversível: no entanto, é possível identificar uma atenuação mais clara, menos precisa da carga genética do que nas psicoses reversíveis constitucionais. Em síntese: as diatéticas não são constitucionais, são uma atenuação.
No grupo das psicoses diatéticas de Kleist não há formas progressivas, só existem formas reversíveis. Se quisermos classificar dessa forma teríamos psicoses progressivas assemelhando-se com as degenerativas e as reversíveis seriam constitucionais ou diatéticas. Portanto, na constituição dos grupos do ciclo heredológico, colocamos à parte, as de Kleist.
Entre as psicoses progressivas e reversíveis há quadros também mistos. Vamos verificar que também ocorrem em função de tendências genéticas: ocorrem com certa frequência e são mais ligados com as psicoses reversíveis do que com as progressivas, mas também ocorrem com essas.
Nas psicoses degenerativas de Kleist ou diatéticas o quadro misto é a regra – há muito mais interpenetração de genes – que nas formas constitucionais. É um grau mais acentuado de atenuação e, ao mesmo tempo, uma manifestação de uma tendência genética múltipla: é possível afirmar que isto é a regra geral nas psicoses diatéticas de Kleist. Essa sistemática de psicoses progressivas e psicoses reversíveis já estava mais ou menos clara antes da genética humana e foi posta em evidência quando se cuidou de fazer um prognóstico empírico baseado na genealogia. O heredoprognóstico empírico, que foi o precursor da genética humana (atentem que decorreu da psiquiatria e não da genética), estabeleceu o risco de manifestação das várias condições mórbidas nas várias famílias. Esse estudo foi feito de maneira mais ou menos sistemática, especialmente a partir de Rudin.
Ficou como regra a pesquisa de traços genéticos na família quanto às psicoses endógenas e o fato de haver uma semelhança entre o quadro clínico das psicoses progressivas com as psicoses benignas com remissão completa, que levou à confusão diagnóstica entre os autores em geral. Isto ele verificou no ponto de partida para a avaliação da participação genética, isto é, de pacientes que levavam a mesma rubrica por apresentarem determinada manifestação clínica, mas que pertenciam a quadros clínicos diferentes. Assim, vemos que Wernicke mostrou isto claramente e, mais tarde, Kahlbaun e Hecker. No entanto, Kleist foi mais preciso, quando aprofundou o estudo do material clínico classificado por Wernicke como psicoses autóctones, como psicose da motilidade com ideias autóctones, psicose de inspiração. Kleist mostrou que esses pacientes de Wernicke – que iam para o estado demencial, eram pacientes esquizofrênicos agitados; pacientes com lesões cerebrais ou com psicoses tóxicas; paciente com manifestação de agitação, ideias delirantes e com automatismo mental -, pertenciam a grupos diferentes do que a da simples psicose da motilidade. Ele distinguiu, em primeiro lugar, o que chamou de psicose da motilidade em sentido estrito. Em 1908 publicou a sua tese de docência sobre as psicoses da motilidade. Na sequência estabeleceu uma rotina exaustiva e precisa de pesquisa com a qual examinou os pacientes nos aspectos motriz, intelectual e afetivo. Em 1909 publicou novos trabalhos expondo a questão da heterogeneidade do material clínico de Wernicke. Depois estendeu essa mesma análise aos pacientes da chamada catatonia de Kahlbaum e aos casos de hebefrenia de Hecker. Dessa forma, foi possível demonstrar que Kahlbaum, Hecker e Kraepelin agruparam quadros que apresentavam semelhança sintomatológica, mas, que geneticamente eram diversos.
Quando Kraepelin fez a grande síntese dele em 1893 tomando como referência Wernicke, Kahlbaum e Hecker, na Alemanha e, Magnan e Morel na França, ele reuniu todo o grupo das formas reversíveis como PMD e todas as outras, quer a chamada demência precoce, demência de vários tipos, hebefrenia, catatonia, como demência precoce. Assim, essa forma de evolução (para a demência, precocemente) constituiu o paradigma das doenças progressivas.
Do ponto de vista do prognóstico, havia uma certa unidade entre esses diversos autores: um prognóstico benigno para a PMD e um prognóstico reservado para a demência precoce.
Em 1908, quando Kleist começou a estudar esses quadros clínicos verificou no grupo, que ele chamou de demencial, uma tendência para a degeneração dos sistemas cerebrais. Mas havia casos que não correspondiam a esse aspecto, eram casos que tinham um decurso diferente: se todos, na fase aguda, tinham a mesma manifestação clínica, o mesmo quadro clínico, porque alguns iam ao estado demencial e outros não. Fez a depuração do grupo de pacientes com catatonia como catatonia no sentido estrito e aparente e da mesma forma com a hebefrenia, diferenciado uma no sentido estrito e outra aparente.
Finalmente estudou as doenças progressivas com embotamento (embotamento no sentido de perda global da capacidade mental, estado demencial). Ele mostrou que esse embotamento – que corresponde ao quadro final de alguns quadros clínicos -, corresponde à uma tendência genética para os sistemas cerebrais serem atingidos de um modo específico.
Em 1911 percebeu a necessidade de separar-se os quadros clínicos. Nessa época foi quando apareceu a publicação de Bleuler referente à Esquizofrenia.
Em 1923, Willmann publicou um trabalho sobre a unidade da Esquizofrenia e admitiu a forma de Bleuler como Esquizofrenia, assumindo tratar-se de uma doença unitária. Kleist – que nesta época já formulara a hipótese da multiplicidade -, fez um estudo sobre os quadros de Willmann e mostrou que não existia razão a este autor, do ponto de vista genético. Em 1918, já havia publicado um relatório sobre as doenças progressivas com embotamento mostrando que nesses casos havia uma degeneração citológica dos sistemas cerebrais e, ao mesmo tempo, dinâmica. Nessa ocasião, fazendo uma crítica a Willmann, mostrava que essa degeneração dos sistemas cerebrais deveria ser um problema de afinidade bioquímica, da sensibilidade do organismo a tóxicos que atingem, eletivamente, os sistemas cerebrais acarretando um quadro psíquico e um quadro neurológico. Assim, ele sustenta que “as doenças hereditárias devem ser consideradas doenças dos sistemas cerebrais”: formulava uma hipótese sobre a atuação de substância endotóxica com afinidade eletiva sobre determinados sistemas cerebrais. Dessa forma, as doenças mentais seriam análogas às neuropatias, às várias formas de atrofia muscular, a doença de Friedreich, as atrofias cerebelares hereditárias, a Coréia de Huntington, a doença de Wilson, dentre outras. Ele mostrou claramente esse aspecto, isto é, como há sistemas cerebrais que são atingidos (embora não se saiba como).
Posteriormente, em 1918, quando publicou esse relatório, ele publicou o tema “Sistematização das doenças mentais progressivas” e deu a elas o nome de progressivas decorrentes da degeneração de sistemas cerebrais. Entre elas fez uma primeira classificação que em linhas gerais estabelecia quatro tipos de alterações cerebrais com embotamento progressivo. O primeiro seria o “embotamento incoerente”, que é o núcleo das psicoses progressivas, em sentido estrito. Era, portanto, o quadro clínico clássico das doenças progressivas. Em segundo lugar, vinham algumas formas satélites dessas em que apareciam outros sintomas além do embotamento: alucinose progressiva (alucinação), psicose progressiva de referência (o embotamento pode aparecer mais tardiamente), somatopsicose progressiva, autopsicose, fantasiofrenia e, finalmente, outra forma que deveria ser admitida, embora não fosse exatamente nesse sentido, de manifestação de elaboração, a chamada Esquizofasia (distúrbio na expressão). Mostrou sete quadros distintos nas psicoses progressivas com embotamento.
No grupo das esquizofrenias, a diferença fundamental entre o critério usado por Kleist e o que foi usado por Kraepelin e depois por Bleuler, está em que o primeiro baseou o diagnóstico dos quadros clínicos na patogênese dos sintomas, estudando os sistemas cerebrais envolvidos na configuração do quadro patológico. Bleuler e Kraepelin tomaram como ponto de partida a descrição clínica. Em certo sentido, Kleist dissociou os quadros clínicos explicitando a sua heterogeneidade. Krapelin e Bleuler, pelo contrário, agravaram essa heterogeneidade, incluindo pacientes que não tinham nada em comum entre si, a não ser a apresentação da fase aguda, no decurso da instalação da psicose.
Bleuler, principalmente, operou em uma lógica totalmente diversa de Kleist. Ele abrangeu na sua conceção de esquizofrenia, tudo o que estava na psiquiatria, que não fosse a epilepsia e a oligofrenia, incluindo quadros clínicos vinculados ao grupo da PMD, porque ficou apenas como critério o estudo fenomenológico, a manifestação clínica momentânea do paciente.
Como procuramos mostrar, Kleist, na primeira divisão que fez dos quadros clínicos, já apontava para as alterações diversas de setores da personalidade. Por exemplo, no embotamento incoerente, o que se produz é um apagamento contínuo, progressivo de todas as funções psíquicas não havendo, praticamente, sintomas produtivos. Kleist aplicou a esse quadro o termo de simples, o qual não tinha nenhuma manifestação produtiva.
No quadro de Alucinose havia uma perda da noção da realidade devido às alucinações ou por automatismo mental (que correspondia à sua fase inicial). Na Somatopsicose havia uma alteração de integração da esfera afetiva, no sentido proprioceptivo e, na Autopsicose, o mesmo distúrbio, mas no sentido da identificação de si mesmo, da noção de si mesmo. Na Fantasiofrenia, há uma produção desordenada da elaboração mental, sem modificação da realidade, mas partindo do paciente para o exterior uma vez que ele vê as coisas de uma maneira arbitrária, incompreensível, a não ser que se analise o quadro clínico pelo aspecto da dinâmica cerebral. A psicose de Referência, é uma forma progressiva também, mas com a interpretação dos fenômenos do mundo exterior em relação a si próprio, no sentido de autoreferência que se manifesta no quadro clínico como produção delirante, portanto, produtiva, em relação à forma simples do embotamento incoerente.
Na esquizofasia, quadro descrito primeiramente por Kraepelin, o que há é uma perda da comunicação, que não se realiza por desinteresse, mas decorrente de distúrbio na fase de elaboração. A esquizofasia corresponde, portanto, à parafasia dos quadros orgânicos e uma perda do encadeamento do raciocínio. O indivíduo diz coisas incompreensíveis, não tanto por distúrbios da elaboração, que também está alterada, mas por desordem da expressão verbal.
Na concepção de Kleist há doenças mentais progressivas que se manifestam através de sistemas da esfera intelectual (embotamento), aquelas que se manifestam por alterações do comportamento explícito (catatonia) e as que se manifestam, predominantemente, por distúrbios afetivos (a hebefrenia). Em cada um desses grupos ele separou a forma nuclear, a que correspondia legitimamente ao diagnóstico de hebefrenia, de catatonia ou de doença mental progressiva, daqueles que traduzia apenas aparência devido aos sintomas da fase inicial: mantinha, portanto, essas condições mórbidas como independentes entre si.
Quando Bleuler publicou uma revisão do conceito de esquizofrenia em 1911, mostrando que os quadros clínicos não eram demência e sim uma cisão da personalidade, em que o autismo, a decadência afetiva e o desinteresse afetivo e uma certa falta de iniciativa, constituíam elementos comuns a todos os quadros clínicos, procurou dar um sentido dinâmico, mas diferente do de Kleist. Este atribuiu a dinâmica cerebral como substrato da expressão clínica e Bleuler atribuiu à dinâmica, em sentido geral, sem basear na evolução (que poderia evoluir para o estado demencial, se deter com alguma sequela ou remitir completamente). Mas essa concepção de que poderia haver diversos tipos de evolução, a manifestação clínica seria a característica fundamental: portanto, quadros de etiologia diversas se confundiram sobre o mesmo rótulo diagnóstico, perdendo-se completamente a noção de prognóstico.
Se compararmos a sistemática de Kraepelin com a de Bleuler e a de Kleist, verificaremos uma grande diferença no sentido de que as formas de Kleist expressam uma tendência uniforme, com o quadro clínico manifestando-se pela esfera da personalidade atingida. Assim, o quadro clínico não é arbitrário, como no modo de ver de Krapelin e de Bleuler.
Depois da descrição da hebefrenia por Bleuler (1918-1921), Kleist aceitou também a denominação de esquizofrenia, procedendo a uma revisão dos quadros que ele tinha descrito. Descreveu diversos quadros: 4 na hebefrenia e 7 na catatonia e os quadros de demência precoce, com embotamento progressivo, ele chamou de paranoides. Mais tarde, desenvolveu o entendimento sobre esses quadros considerando uns típicos e outros atípicos. Atípicos porque envolviam fatores de uma esfera da personalidade, dando uma atipia à manifestação clínica do momento e também atípico pelo decurso, porque algumas dessas formas (devido à tendência genética do paciente) tinham remissão parcial. Mostrou na catatonia duas formas remissíveis, na esquizofrenia uma forma remissível parcial e desdobrou essas psicoses nos elementos de elaboração e expressão dando as formas confusionais.
Das confusionais também algumas formas são passíveis de remissão parcial. Há surtos que podem aparecer com remissão, mas esta não é integral, dando margem sempre a uma sequela no paciente. Essas são as formas atípicas. Karl Leonhard, em 1936, publicou um estudo sobre os quadros clínicos da esquizofrenia residual, comparável ao de Kleist, de tal forma que a fantasiofrenia, por exemplo, ele incluiu nas formas de parafrenia. Em relação à Alucinose, encontrou uma forma de Alucinose residual. Relativamente às psicoses de Referência encontrou um quadro correspondente. Em relação à Somatopsicose de Kleist, encontrou a chamada Alucinose residual que chamou Hipocondria. Notem, portanto, a concordância, embora sejam diferentes os quadros clínicos entre as somatopsicoses (preocupação relativa ao corpo) e a hipocondria (preocupação excessiva com as condições vegetativas somáticas). Em relação à Autopsicose progressiva encontrou as que chamou esquizofrenia paranoide expansiva. Notem que a Autopsicose no sentido de Kleist, é uma forma expansiva também.
No embotamento incoerente encontrou a esquizofrenia residual incoerente. Em todo quadro clínico final, Leonhard encontrou a mesma sistematização de Kleist. Nas formas de esquizofasia, encontrou também uma esquizofasia residual – esquizofasia como forma atípica. Assim, ele descreveu outras formas que Kleist não fez, como a esquizofrenia residual autística que corresponderia à hebefrenia residual, autística de Kleist.
Em relação às catatonias, encontrou que a catatonia hipocinética de Kleist correspondia a 3 formas da catatonia residual: a mutista, a rígida e a loquaz. Para a forma paracinética de Kleist, encontrou uma que chamou catatonia fatal, a mesma forma em relação à catatonia negativista de Kleist, encontrou uma catatonia residual negativista. Em relação à catatonia iterativa e estereotípica de Kleist, ele encontrou uma hebefrenia residual com isolamento do meio exterior. Em relação à hebefrenia com abulia encontrou a hebefrenia residual com abulia, uma depressão residual em relação à depressiva de Kleist.
Vemos uma correspondência entre a sistemática de Kleist na fase aguda e a de Leonhard, estabelecida em relação ao quadro final, informando prognósticos desses quadros. Depois Kleist e seus discípulos (incluindo Leonhard) fizeram estudos de catamneses dos quadros que tinham sido examinados por Kleist nos 25 anos de hospital. Assim é que desdobrou a somatopsicose na forma hipocondríaca.
A forma paracinética e procinética foram desdobramentos da catatonia hipocinética. A forma estereotípica desdobrou na estereotípica clássica e na iterativa que é uma variedade com evolução por surtos. A prolálica modificou em oposição à mutista, aqui há uma incapacidade para comunicar-se (daí o mutismo) e aquelas em que o paciente reage friamente ao interrogatório. A autopsicose, a somatopsicose e a alucinose são quadros diversos e que colocamos numa distribuição diferente da inicial de Kleist, porque são sistemas cerebrais diversos atingidos cada um mais dependente hierarquicamente.
Assim, temos uma perda de contato em relação à própria pessoa, no sentido somático, no mundo exterior no sentido do recebimento dos estímulos, confabulose, no sentido da elaboração dos estímulos e as psicoses de influência, como partindo do meio para o indivíduo. A psicose de inspiração em que o indivíduo tem a sensação de produzir coisas que partem dele para o ambiente e a fantasiofrenia em que ele participa no ambiente modificando inclusive a própria personalidade, transformada em relação ao que era antes. Muitos pacientes com o chamado delírio cósmico correspondem à Fantasiofrenia.
Também há a forma paralógica onde ocorre um distúrbio extrínseco às funções intelectuais.
O sistema que Kleist adotou para classificação dos quadros clínicos, baseado na patogênese, é diverso do que Leonhard veio adotar para a mesma categoria de doenças progressivas. A diferença fundamental estava no fato de que as formas atípicas, Leonhard considerava como assistemáticas.
Assim, as formas sistemáticas da esquizofrenia seriam essas que Kleist estabeleceu e que ele encontrou na fase residual, e as formas assistemáticas seriam aquelas em que o elemento de evolução não é constante e o colorido do quadro clínico é diverso e discordante. Nesses, estabeleceu 3 formas atípicas e assistemáticas: a catatonia periódica, a parafrenia afetiva e a esquizofasia. As outras formas de Leonhard são formas típicas e todas elas correspondem às de Kleist.
As formas mais características para Kleist são, a pueril (hebefrenia), forma acinética (catatonia), fantasiofrenia (paranoide) e incoerente (confusional). As formas atípicas de Kleist (grupo das parafrenias) são: psicose de interpretação, de referência, o delírio circunscrito. A esquizofrenia confusional por surtos é atípica, assim como a forma da catatonia iterativa por surtos. Se analisarmos a patogênese verificaremos que é perfeitamente compreensível as formas classificadas por Kleist e Leonhard.
- Texto organizado pelo Dr. Roberto Fasano Neto, em 2003, a partir de aula de Aníbal Silveira, proferida em 18/12/1968 em Campinas, sem referência de quem a compilou, sendo revisto, em 31/10/22, por integrantes da Comissão de Revisão do CEPAS: Flávio Vivacqua, Francisco Drumond de Moura, Paulo Palladini e Roberto Fasano Neto. . As referências adicionais em azul serão vinculadas a um texto relacionado com um determinado autor ou um determinado assunto. ↩︎