AS GRANDES SÍNDROMES PSIQUIÁTRICAS

AS GRANDES SÍNDROMES PSIQUIÁTRICAS1

Há dois conceitos bem distintos sobre Síndrome Psiquiátrica. Um que a denomina como o conjunto de sinais que permitem avaliar qual a esfera psíquica atingida: é o conceito mais razoável e análogo ao que chamamos síndrome na Clínica Médica e na Clínica Neurológica. 

Outro conceito é aquele admitido por alguns psiquiatras que identificam a síndrome psiquiátrica com o diagnóstico de doença mental. Esse ponto de vista parece indefensável. Por exemplo, quando mencionamos síndrome esquizofrênica não podemos dizer que se trata de esquizofrenia. Caso contrário teríamos esquizofrenias de todos os tipos, inclusive nos Paralíticos Gerais, onde aquela “síndrome” pode ser observada. A mesma coisa poderíamos dizer com referência à mania.

Há uma série de síndromes psiquiátricas. São elas comuns a várias doenças mentais. A doença mental é também um conceito abstrato. Podemos considerar síndrome psiquiátrica num conceito mais restrito, como apenas fazendo referência ao cérebro. É um conceito puramente dinâmico, se bem que em alguns casos possa corresponder a um quadro orgânico. 

Retomando a caracterização de síndrome psiquiátrica como relacionada com o setor psíquico afetado, na prática cumpre ponderar:  

  1. A síndrome psiquiátrica que o doente apresenta é uma parte do quadro mental. Assim, quais são os elementos pelos quais podemos chegar ao quadro mental partindo da síndrome psiquiátrica?
  2. Nesse sentido, o exame clínico é fundamental.
  3. Necessidade de exames complementares: ninguém diagnostica febre tifoide só pelo aumento do volume do baço, os exames complementares são indispensáveis.
  4. Realização da Anamnese. Aqui devemos considerar dois aspectos: (a) como apareceu e como se desenvolveu a moléstia; (b) dados heredológicos. Por exemplo, um paciente com psicose fásica enquadrável na Psicose Maníaco-depressiva, pode ter contraído sífilis e se tornar precocemente neuro-luético. O quadro apresentado não está ligado à sífilis, mas às tendências heredológicas. De nada adiantaria um tratamento unilateral. Estamos diagnosticando o conjunto da pessoa.

A síndrome psiquiátrica deve ser compreendida como um elemento para iniciar o raciocínio clínico. Porque a noção de doença mental é uma abstração: o que vamos tratar não é a doença, mas sim o paciente.

Como aproveitar, no plano semiológico, os vários elementos para o diagnóstico? No exame clínico devemos incluir como rotina o exame otorrinolaringológico, o exame oftalmológico etc. Nos exames complementares podemos considerar a necessidade: líquor, bioquímica do sangue, exames outros hematológicos.

Na anamnese, procuramos nos antecedentes familiares, esclarecer os casos de doença mental, segundo a forma clínica e o decurso. 

Podemos organizar em nove grupos as síndromes psiquiátricas:

  1. Síndrome de Confusão Mental:
  2. Confusão mental propriamente dita
  • Amência
  • Confusão mental alucinatória
  1. Delírio onírico
  2. Delírio agudo
  • Hipercinético
  • Acinético

Entre esses quadros podemos ter variações, no que respeita às relações do paciente para com o ambiente. Assim teríamos uma desagregação (amência) ou uma produção acentuada do trabalho mental. Daí temos também confusão mental estuporosa e alucinatória. E dentro da atividade mental delirante, temos que fazer distinção entre o delírio agudo com grave alteração cerebral, e o delírio febril como repercussão do estado geral. Podemos ter os dois fenômenos ao mesmo tempo.

Em qualquer dos casos, o característico é a ruptura do contato com o ambiente. Um tumor cerebral, a neurossífilis, a encefalite, as infecções orgânicas, podem dar este quadro de confusão mental. Entretanto, todas as formas podem ser de origem endógena: é o caso das formas degenerativas de Kleist. Só podemos evidenciá-las perante os dados heredológicos.

  1. Síndrome de Desagregação Psíquica:

Temos aqui uma ruptura dos processos intrapsíquicos. Essa ruptura atinge os dois níveis de contato com o mundo exterior: a senso-percepção e a elaboração. Assim, vamos encontrar as alucinações, os fenômenos de automatismo mental e os delírios. O delírio é um desvio mórbido do juízo, sem confusão. Alucinações e delírios podem ocorrer em qualquer entidade psiquiátrica. As síndromes psiquiátricas estão ligadas mais à disposição pré-psicótica do que à doença mental em si mesma.

  1. Síndrome de Carência de Iniciativa:

É uma ruptura que se faz ao nível dos componentes conativos. O protótipo dessa síndrome é observado na esquizofrenia. Entre outras manifestações aí se observa falta de interesse pelo ambiente, e em casos mais avançados, falta de interesse pela própria situação. Pode haver também uma incapacidade de aplicação prática do trabalho mental, absorvido pelos distúrbios sensoriais.

  1. Síndrome de Excitação Psíquica

Está mais ligada às psicoses infecciosas, à Psicose Maníaco-depressiva, bem como com as psicoses fásicas de Kleist, sendo necessário proceder ao diagnóstico diferencial.

  1. Síndrome depressiva:

Temos aqui o inverso do que se passa na excitação psíquica.

  1. Síndrome de deficiência mental:

Pode ser puramente intelectual, ligado a uma deficiente evolução. É o que se observa nos quadros oligofrênicos, nas encefalopatias. Tem muita importância, nesses casos, a época do aparecimento dessas. Por exemplo, aquelas surgidas tardiamente podem estar ligadas à esclerose centro-lobar desmielinizante de Schilder, ou de Jakob-Creutzfeldt. Ou ainda às formas de Pick e de Alzheimer. 

  1. Síndrome de Perversão Instintiva

Caracteriza-se pela falta de polarização do comportamento no sentido social. Há dois tipos: 

  1. Sequela de encefalite epidêmica na infância
  2. Personalidade psicopática

Tanto numa, como na outra, pode estar em causa a perversão instintiva, que pode permanecer no estado latente e ser desencadeada por conflitos ambienciais, embora na primeira hipótese haja um processo toxi-infeccioso. Podemos ter uma incapacidade de autodomínio, por impulsividade mórbida. A realização do exame neuro oftalmológico é básico para o diagnóstico diferencial.

  1. Síndrome convulsiva:

Pode ser expressão da epilepsia, como condição endógena, ou simples reação cerebral sintomática (tumor, processos vasculares ou tóxicos, como na eclampsia), a qual, entretanto, não exclui a primeira. Essas reações são chamadas erroneamente de “epilepsia sintomática” ou levam a rotular o paciente como oligofrênico epiléptico. Muitas vezes não se trata nem de oligofrênico, nem de epiléptico, mas de doente com encefalopatia difusa. Qualquer processo infeccioso pode levar à convulsão. Temos aí que lançar mão da anamnese heredológica para o diagnóstico diferencial. O EEG não impõe diagnóstico nem o confirma, quanto à epilepsia.

  1. Síndrome de comprometimento parcial da personalidade:

É o que se observa na estrutura psíquica da neurose. Não há ruptura dos processos psíquicos, mas interferência emocional não consciente, portanto, essa síndrome se situa fora do campo da psiquiatria.

  1.  Texto organizado por Roberto Fasano, em 2003, a partir de aula de Aníbal Silveira, proferida no curso de Semiologia Psiquiátrica no Hospital de Juqueri, Franco da Rocha SP no dia 27 de julho de 1946, aula compilada pelo Dr. José Maria Cabral de Vasconcelos. Revisto em 20/09/22 por integrantes da Comissão de Revisão do CEPAS: Flavio Vivacqua, Francisco Drumond de Moura, Paulo Palladini e Roberto Fasano. ↩︎